Em entrevista ao Contexto Online, o jornalista Cláudio Nunes afirma que o pleito de 2008, em Aracaju, poderá significar um marco histórico se eleger um candidato aliado ao governador pela primeira vez em 23 anos.
Pensar em cobertura política em Sergipe e não associá-la ao nome do jornalista Cláudio Nunes é algo difícil de acontecer. Formado na então Faculdades Integradas Tiradentes (atual Universidade Tiradentes), há 15 anos ele vem atuando diariamente no jornalismo político sergipano, seja nos principais jornais diários do Estado, na TV, no rádio ou mesmo em assessorias de comunicação de instituições como a Assembléia Legislativa e a Câmara de Aracaju. Ainda na adolescência, Cláudio Nunes já demonstrava sinais de que o jornalismo era a sua verdadeira vocação, quando lançou um jornal na época em que foi presidente do grêmio da então Escola Técnica Federal de Sergipe. O seu lado político, que também já se mostrava bastante forte, se firmou ainda mais quando o jovem aspirante a jornalista fundou e presidiu a União Metropolitana dos Estudantes Secundaristas de Aracaju (Umesa). Considerando-se atualmente “aposentado” dos jornais diários, Cláudio possui uma
coluna no Portal Infonet desde 2006, onde faz suas análises sobre o cenário político do Estado. Seus artigos publicados no portal durante o último período eleitoral deram origem a um livro, chamado “A Liberdade da Expressão”. Confira a seguir a entrevista com Cláudio Nunes sobre as eleições majoritárias deste ano em Aracaju.
Contexto Online - Em primeiro lugar, como você avalia as eleições deste ano em relação ao cargo majoritário de Aracaju? Há algo de novo em 2008 que pode fazer a diferença em comparação com as disputas passadas?
Cláudio Nunes - Faltam apenas dois meses para as eleições municipais de outubro e em Aracaju não surgiu nada de novo. São cinco candidatos e três deles, Almeida Lima (PMDB), Edvaldo Nogueira (PCdoB) e Mendonça Prado (DEM), têm uma estrutura de campanha maior, porém, o quadro atual não leva para uma disputa acirrada. E se não surgir um fato novo não haverá nem mesmo segundo turno. Aliás, este fato novo seria a renúncia de Mendonça e a candidatura do ex-governador João Alves, o que muitos articulistas da imprensa ainda cogitam. A partir da segunda quinzena deste mês, com o início do horário eleitoral gratuito, o quadro estará desenhado completamente. Por enquanto, a campanha está muito parecida com a passada, quando o prefeito de então, Marcelo Déda, não teve adversários à altura. No caso de agora, Edvaldo tem como trunfo Déda no governo estadual.
Contexto - E sobre esse boato de que, na última hora, João Alves assumiria a candidatura do DEM em Aracaju, que já foi negado por Mendonça, você acha que isso seria mesmo possível? Em sua opinião, o DEM fez uma má escolha ao colocar Pedrinho como vice e não como prefeito?
C.N - Não acredito que João Alves anuncie candidatura este ano. Além do problema de saúde da senadora Maria do Carmo, ele também tem outros problemas para resolver. Em 2010 são duas vagas para o Senado, hoje ocupadas por Almeida e Valadares, e João Alves é um forte candidato. Por outro lado, mesmo que a candidatura de Mendonça Prado não seja vitoriosa, ela consolida o nome do genro de João na faixa do eleitorado dos Democratas e garantirá um percentual de votos para a reeleição dele à Câmara dos Deputados. Sem dúvida nenhuma Pedro Valadares seria um nome mais “leve”, mas a desculpa foi que nas pesquisas qualitativas a transferência do eleitorado de João era maior para Mendonça Prado. Acho que não foi má escolha, e sim uma decisão foi meramente familiar.
Contexto - Em entrevista ao Cinform da semana passada, o candidato do PCB, Anderson Góis, afirmou que todos os que concorrem ao cargo têm condições de ganhar e, para defender sua tese, citou o exemplo de Marcelo Déda nas eleições de 2000, quando em pesquisas iniciais esse aparecia com apenas 6% das intenções de voto. No final, Déda saiu vitorioso. O senhor concorda que realmente todos têm chances de vencer?
C.N - Não. Seria bom que o professor estivesse certo, mas a realidade do sistema eleitoral é outra. E é uma realidade que prejudica os candidatos com poucas condições. Por outro lado, boa parte do eleitorado ainda troca seu voto por algum favor. Essa é uma realidade que não será resolvida apenas com a mudança do sistema eleitoral, mas com a conscientização do eleitorado. Enquanto a maioria dos eleitores não for esclarecida, os candidatos como o professor Anderson - cujo partido foi, em 1985, o único ao qual me filiei até hoje - continuará sendo chamado de “nanico”.
Contexto - Partindo do princípio da democracia, como você analisa o fato de alguns debates excluírem os candidatos menos cotados? Você acha que essa pode ser uma atitude razoável ou pensa que ela contribui apenas para firmar os concorrentes mais fortes no pleito?
C.N - É um absurdo! Na semana passada, a Band TV deu um show de democracia abrindo uma roda de debates com os candidatos em São Paulo. Todos eles, sem exceção. Isso é democracia. O debate foi importante com candidatos considerados pequenos, como a jornalista Soninha do PPS, bastante interativa. Para os candidatos considerados pequenos, como o professor Anderson, os debates são o espaço mais importantes para esclarecer o eleitorado, já que até o horário eleitoral não ajuda, devido ao curto espaço de tempo.
Contexto - Segundo o cientista político Hélder Teixeira, um dos motivos para as poucas expectativas em relação às eleições deste ano é a questão das alianças que englobam “gregos e troianos”, o que supostamente tira o crédito dos candidatos e dos seus respectivos partidos. Você concorda com essa afirmação? A união entre PCdoB e PSDB, por exemplo, é boa para Edvaldo?
C.N - Essa questão das alianças não afeta a decisão da maioria do eleitorado. Tem influência numa parcela da classe média. É preciso lembrar que em 2004, na última eleição municipal, o PT de Déda foi apoiado pelo PSDB em Aracaju. Essa aliança prejudica apenas junto ao voto ideológico, que hoje em dia representa um percentual pequeno. Nas pesquisas, os votos de Fabiano Oliveira (PSDB), chegavam a 10% em 2004. De acordo com as pesquisas, boa parte desses votos vai migrar para Edvaldo Nogueira.
Contexto - O apoio dos governos estadual e federal à reeleição de Edvaldo Nogueira poderá decidir o pleito ou você acredita que esse seja um fator secundário?
C.N - Não é secundário. Pelo contrário, entendo como um dos principais fatores para o desempenho que Edvaldo vem tendo nas pesquisas. Se Déda continuar acompanhando Edvaldo em alguns bairros, como vem fazendo, será importante. O candidato à reeleição tem consciência de que o carisma de Deda é uma arma forte. Já o Lula – não é necessário escrever – em todo o país os candidatos brigam pelo apoio dele, a exemplo de Salvador.
Contexto - E a questão do PMDB, um dos principais aliados do Governo Federal, como fica em Sergipe, especialmente em Aracaju, com o “racha” entre o PMDB de Almeida Lima e o de Jackson Barreto? Quais seriam as conseqüências para o partido caso Edvaldo ganhasse? E se o vitorioso fosse Almeida?
C.N - A eleição municipal decidirá também o comando do PMDB em Sergipe. Se for derrotado, Almeida perderá força junto à Direção Nacional e certamente terá que procurar outra legenda. Se vencer, não só toma o comando do PMDB como se torna a principal liderança de oposição em Sergipe. A não candidatura de João Alves neste ano deixou vários órfãos em todo o Estado. O DEM foi enfraquecido em municípios importantes. Almeida luta não só pela Prefeitura, mas para comandar esse espólio eleitoral.
Contexto - Como a biografia dos candidatos influenciará na decisão do eleitor? Em sua opinião, os sergipanos têm uma boa memória política?
C.N - Não. A classe média ainda tem uma memória, mas boa parte rema conforme a maré, ou melhor, conforme seus interesses particulares. É a pura verdade. É só lembrar da eleição de 2006, quando você via, nas esquinas de Aracaju, famílias da classe média pedindo votos para um candidato no intuito de defender seus cargos comissionados. E o pior, a grande maioria não trabalhava. Em Aracaju, esta eleição será um divisor de águas, já que a capital sempre votou no candidato de oposição ao governador, menos no ano do retorno das eleições diretas, em 85, quando João Alves era governador e ajudou na eleição de Jackson Barreto. De lá para cá, o governador de plantão não elegeu seu candidato. Se você for para a periferia, aí é que a memória política some, principalmente para os cargos proporcionais.
Contexto - Em relação à pesquisa do Instituto Dataform divulgada na semana passada, o senhor acredita que os números se manterão? E quanto ao segundo turno, o senhor acha possível? Quem disputaria?
C.N - Prefiro não comentar a pesquisa do instituto referido. Só para lembrar, nas eleições de 2006, por artigos sobre as pesquisas naquele período, tenho alguns processos, inclusive criminais, do referido instituto. Sou bastante cético em relação às pesquisas quantitativas, prefiro mais as qualitativas, que dá uma visão mais abrangente do eleitorado. Agora, independente das pesquisas que estão sendo divulgadas, o correto é esperar o horário eleitoral e, no final deste mês, o quadro estará mais próximo do real. Repito, se não houver um fato novo, dificilmente Aracaju terá segundo turno.
Contexto - Essa questão da veracidade das pesquisas eleitorais foi um tema bastante discutido nas últimas eleições, já que existem casos em que as mesmas são financiadas por candidatos. Qual é a regulamentação para este ano? Como o senhor vê essas pesquisas?
C.N - Apenas um instituto, o Única, acertou em cheio as pesquisas em 2006. Digo isso por dever de justiça, porque se você fizer uma pesquisa no meu blog na Infonet verá como fui contundente com estes institutos e, depois de dois anos, ainda enfrento problemas judiciais. Não me arrependo de nada, pelo contrário, já estou pronto para analisar outras pesquisas, no momento certo e na hora certa. Acho que a Justiça Eleitoral avançou muito em proibições na campanha eleitoral, mas deixou as pesquisas à vontade com uma simples antecipação do registro delas nos tribunais regionais. Qualquer leigo que tiver curiosidade pode realizar pesquisas e, conforme a metodologia usada, pode beneficiar determinado candidato. Existem pesquisas sérias, mas tem também “pacotes” encomendados. Por exemplo, tem um instituto que faz um “pacote” com quatro pesquisas. O mundo político de Sergipe tem conhecimento disso.
Contexto - Ainda sobre as pesquisas, algumas delas indicam que os maiores transferidores de votos em Aracaju são o governador Marcelo Déda - para Edvaldo - e a senadora Maria do Carmo - para Mendonça. Quem poderia transferir votos para Almeida? Ou ele não está contando com isso?
C.N - Almeida Lima tem uma faixa do eleitorado que não ultrapassará os 20% do primeiro turno. Ele mesmo é o seu próprio cabo eleitoral, mas, por outro lado, também é um dos seus principais adversários. A sua rejeição, em todas as pesquisas, se aproxima de 30%. É um percentual grande e difícil de reverter. Já Déda e Maria do Carmo transferem votos, a senadora num percentual bem pequeno. As pesquisas qualitativas comprovam que o eleitorado de Maria do Carmo na periferia tem uma admiração grande por ela, mas na hora da transferência, esse eleitorado despenca.
Contexto - Como os candidatos podem se destacar na campanha de 2008?
C.N - A história eleitoral em Sergipe e Aracaju vem mostrando que o eleitorado não gosta de baixarias. Déda saiu de um percentual ínfimo em 2000 e ultrapassou Almeida e Valadares, que lideravam as pesquisas, porque os dois resolveram fazer uma campanha eleitoral de troca de acusações. Não deu outra: Déda correu sozinho, mostrando propostas. Grande parte do eleitorado quer soluções para os problemas do seu cotidiano. Um bom exemplo é o sucesso de Lula. Tenho várias criticas ao Bolsa Família, mas é uma ação que chega na casa do eleitor diretamente, sem intermediários. Deu certo, e pode anotar isso, o próximo presidente da República, de qualquer partido, prometerá em sua campanha que não acabará com o projeto. Se for contra, não se elege.
Contexto - Uma última pergunta. Muita gente se questiona como é que um candidato se propõe a gastar R$ 4 milhões - como Almeida - ou até R$ 5 milhões - como no caso de Edvaldo - em uma campanha que, se sair vitorioso, não arrecadará mais do que R$ 645 mil juntando o salário recebido nos quatro anos do mandato. Como funciona isso?
C.N - Sempre questionei isso também. Acho que o Brasil precisa encontrar um modelo melhor, que deveria ser o financiamento público, em que todos teriam igualdade de condições. Na verdade, esses valores são surreais. Eles gastam muito mais. Aí entra a ajuda do setor empresarial, que, em sua grande maioria, pede a conta mais tarde. No Brasil, a Justiça Eleitoral finge que acredita na prestação de contas do candidato e, em contrapartida, o candidato finge que declara tudo direitinho. Já o eleitor...
Por Thiago Rocha