Encontro Sergipano de História resgata legado de José Calasans
Poucas pessoas conseguem receber o mesmo reconhecimento em Sergipe e na Bahia ao mesmo tempo. Apesar da emancipação política relativamente recente, as distâncias culturais (como a disputa entre a Terra do Axé e o País do Forró) conseguem ser bem maiores do que a extensão da Linha Verde. O que dizer de um pensador que, além de ser freqüentemente homenageado nos dois estados, foi mais incisivo na história de Canudos do que o consagrado Euclides da Cunha?
José Calasans Brandão da Silva, sergipano de Aracaju, conseguiu este feito. E foi exatamente sobre este intelectual que tratou o XII Encontro Sergipano de História (ENSEH), realizado na Universidade Federal de Sergipe (UFS) entre os dias 7 e 11 de julho de 2008. Durante toda a semana do feriado pela Emancipação Política de Sergipe, os participantes tiveram contato com as diversas facetas do mestre.
A data do evento foi escolhida de forma estratégica. José Calasans nasceu em 14 de julho de 1915, quase um século depois da emancipação política de Sergipe frente à Bahia, em 8 de julho de 1820. A vida desse intelectual parecia intimamente ligada a Historiografia, aos dois estados e a essa separação, já que em 28 de Maio de 2001, às vésperas do festivo 8 de julho, faleceu na capital baiana.
Viveu em Aracaju até a década de 50, participando ativamente de movimentos culturais e intelectuais do estado. Foi professor da Escola Normal e aluno e professor do Colégio Atheneu Sergipense, numa época em que esta instituição pública era o berço de intelectuais e políticos futuros. Na outra metade de século, foi professor emérito da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) e vice-reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA) na gestão de Macedo Costa, também sergipano, além de ter presidido a Academia de Letras da Bahia, em Salvador.
O evento
Pode-se dizer que os organizadores saíram satisfeitos do ENSEH, muito por parte da intensa participação dos estudantes. Ao todo, 400 inscritos participaram do evento e tiveram a oportunidade de conhecer e ter acesso às inúmeras realizações de Calasans em conferências, mesas redondas e mini-cursos.
O professor Luís Eduardo Pina Lima, membro da comissão organizadora do evento e integrante do Departamento de História da UFS, afirma que a participação maciça pode ser creditada a vários fatores, como a divulgação do evento e dos muitos cursos de História hoje presentes em diversas instituições de ensino superior. Outro atrativo oferecido aos participantes foram os créditos contados como atividades extra-classe obrigatórias no currículo do curso.
Eduardo Pina avalia positivamente a experiência do Encontro. “Existem muitos professores do nosso departamento que não conheciam José Calasans, por serem de fora do estado, e que fizeram bom proveito do evento ao conhecerem os estudos sobre folclore, Canudos, toda a obra, além da singular figura que foi José Calasans”, afirma o professor. Houve ainda a presença de vários ex-alunos e amigos de Calasans, que prestaram-lhe uma homenagem devida, uma das razões essências da realização do Encontro.
Canudos
Apesar de formado em Direito na Bahia, Calasans logo seguiu sua predileção pela história e pelo folclore, tornando-se Livre Docente em História do Brasil pela Faculdade de Filosofia da Universidade da Bahia. E se no âmbito local dos vizinhos nordestinos, José Calasans já tinha adquirido um patamar de elite na sua intelectualidade, foi ao se debruçar sobre a história de Canudos e de Antônio Vicente Mendes Maciel, o Antônio Conselheiro, que ele tornou-se único nacionalmente.
Em um artigo escrito para o Jornal da Poesia, o professor Eduardo Diatahy Bezerra de Menezes, membro da Academia Cearense de Letras e docente da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e da Universidade Federal do Ceará (UFC), faz um breve esboço sobre a obra e a vida de Calasans. “Bem antes de se tornar um procedimento sistemático da historiografia moderna, ele superou a versão oficial e tradicional sobre Canudos, não só vasculhando ampla documentação nos arquivos da Bahia, Sergipe, Pernambuco e Ceará, mas sobretudo reconstituindo a sua história oral, colhida de remanescentes e combatentes do Arraial do Belo Monte”, afirma.
E foi esta a razão que fez o professor Diatahy chegar a uma conclusão irônica, ao conversar com o próprio José Calasans, um dos seus grandes amigos. “Na confraria dos estudiosos de Canudos: da Bahia para o Sul, eles são euclidianos; da Bahia para o Norte, somos conselheiristas. E ele sempre sublinhava que Euclides da Cunha, em sua obra-prima, trancara Canudos numa gaiola de ouro”, relata. O respeito aos depoimentos prestados pelos próprios sobreviventes e combatentes do conflito, que superava as estatísticas de guerra oficiais, tornaria, para o pesquisador, a história dos seguidores de Antônio Conselheiro mais humana, como deveria ser.
Acervo
Com toda essa pesquisa, que lhe garantiu a memória de investigador infatigável, Calasans produziu uma larga bibliografia sobre a Guerra de Canudos, tema ao qual se dedicou por quase toda vida. Tratou de assuntos também ligados a história de sua terra natal, nunca esquecida depois de sua nova morada soteropolitana, fato corroborado pelo conterrâneo e também historiador Luiz Antonio Barreto.
Todo seu acervo referente à História de Canudos foi doada pelo próprio José Calasans em 31 de agosto de 1983 à Universidade Federal da Bahia (UFBA), o que deu origem à biblioteca Núcleo Sertão. Por sua vez, as obras referentes à história de Sergipe estão disponíveis no Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe (IHGSE) e no escritório de Pesquisas de Sergipe (PESQUISE).
Leia mais sobre José Calasans:
José Calasans Brandão da Silva, sergipano de Aracaju, conseguiu este feito. E foi exatamente sobre este intelectual que tratou o XII Encontro Sergipano de História (ENSEH), realizado na Universidade Federal de Sergipe (UFS) entre os dias 7 e 11 de julho de 2008. Durante toda a semana do feriado pela Emancipação Política de Sergipe, os participantes tiveram contato com as diversas facetas do mestre.A data do evento foi escolhida de forma estratégica. José Calasans nasceu em 14 de julho de 1915, quase um século depois da emancipação política de Sergipe frente à Bahia, em 8 de julho de 1820. A vida desse intelectual parecia intimamente ligada a Historiografia, aos dois estados e a essa separação, já que em 28 de Maio de 2001, às vésperas do festivo 8 de julho, faleceu na capital baiana.
Viveu em Aracaju até a década de 50, participando ativamente de movimentos culturais e intelectuais do estado. Foi professor da Escola Normal e aluno e professor do Colégio Atheneu Sergipense, numa época em que esta instituição pública era o berço de intelectuais e políticos futuros. Na outra metade de século, foi professor emérito da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) e vice-reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA) na gestão de Macedo Costa, também sergipano, além de ter presidido a Academia de Letras da Bahia, em Salvador.
O evento
Pode-se dizer que os organizadores saíram satisfeitos do ENSEH, muito por parte da intensa participação dos estudantes. Ao todo, 400 inscritos participaram do evento e tiveram a oportunidade de conhecer e ter acesso às inúmeras realizações de Calasans em conferências, mesas redondas e mini-cursos.
O professor Luís Eduardo Pina Lima, membro da comissão organizadora do evento e integrante do Departamento de História da UFS, afirma que a participação maciça pode ser creditada a vários fatores, como a divulgação do evento e dos muitos cursos de História hoje presentes em diversas instituições de ensino superior. Outro atrativo oferecido aos participantes foram os créditos contados como atividades extra-classe obrigatórias no currículo do curso.
Eduardo Pina avalia positivamente a experiência do Encontro. “Existem muitos professores do nosso departamento que não conheciam José Calasans, por serem de fora do estado, e que fizeram bom proveito do evento ao conhecerem os estudos sobre folclore, Canudos, toda a obra, além da singular figura que foi José Calasans”, afirma o professor. Houve ainda a presença de vários ex-alunos e amigos de Calasans, que prestaram-lhe uma homenagem devida, uma das razões essências da realização do Encontro.
Canudos
Apesar de formado em Direito na Bahia, Calasans logo seguiu sua predileção pela história e pelo folclore, tornando-se Livre Docente em História do Brasil pela Faculdade de Filosofia da Universidade da Bahia. E se no âmbito local dos vizinhos nordestinos, José Calasans já tinha adquirido um patamar de elite na sua intelectualidade, foi ao se debruçar sobre a história de Canudos e de Antônio Vicente Mendes Maciel, o Antônio Conselheiro, que ele tornou-se único nacionalmente.Em um artigo escrito para o Jornal da Poesia, o professor Eduardo Diatahy Bezerra de Menezes, membro da Academia Cearense de Letras e docente da Universidade Estadual do Ceará (UECE) e da Universidade Federal do Ceará (UFC), faz um breve esboço sobre a obra e a vida de Calasans. “Bem antes de se tornar um procedimento sistemático da historiografia moderna, ele superou a versão oficial e tradicional sobre Canudos, não só vasculhando ampla documentação nos arquivos da Bahia, Sergipe, Pernambuco e Ceará, mas sobretudo reconstituindo a sua história oral, colhida de remanescentes e combatentes do Arraial do Belo Monte”, afirma.
E foi esta a razão que fez o professor Diatahy chegar a uma conclusão irônica, ao conversar com o próprio José Calasans, um dos seus grandes amigos. “Na confraria dos estudiosos de Canudos: da Bahia para o Sul, eles são euclidianos; da Bahia para o Norte, somos conselheiristas. E ele sempre sublinhava que Euclides da Cunha, em sua obra-prima, trancara Canudos numa gaiola de ouro”, relata. O respeito aos depoimentos prestados pelos próprios sobreviventes e combatentes do conflito, que superava as estatísticas de guerra oficiais, tornaria, para o pesquisador, a história dos seguidores de Antônio Conselheiro mais humana, como deveria ser.
Acervo
Com toda essa pesquisa, que lhe garantiu a memória de investigador infatigável, Calasans produziu uma larga bibliografia sobre a Guerra de Canudos, tema ao qual se dedicou por quase toda vida. Tratou de assuntos também ligados a história de sua terra natal, nunca esquecida depois de sua nova morada soteropolitana, fato corroborado pelo conterrâneo e também historiador Luiz Antonio Barreto.
Todo seu acervo referente à História de Canudos foi doada pelo próprio José Calasans em 31 de agosto de 1983 à Universidade Federal da Bahia (UFBA), o que deu origem à biblioteca Núcleo Sertão. Por sua vez, as obras referentes à história de Sergipe estão disponíveis no Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe (IHGSE) e no escritório de Pesquisas de Sergipe (PESQUISE).
Leia mais sobre José Calasans:
Artigo de Luiz Antonio Barreto (com a bibliografia de José Calasans)
Por Luiz Paulo
Fotos: Jornal da Poesia (foto 1) e Luiz Antônio Barreto (foto 2)

Um comentário:
Editores, bom trabalho de novo. Parabéns!
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