Durante dois anos, os estudantes Miriam Carla (Letras) e Horimo Medeiros (Ciências Sociais) acompanharam de perto as dificuldades sofridas por Gil: primeira aluna da Universidade Federal de Sergipe com necessidades especiais. A pesquisa, intitulada “Acessibilidade na UFS: um estudo de caso”, foi apresentada no dia 29 de novembro, na Semana de Acessibilidade da UFS.
De acordo com o trabalho, a universidade não estaria preparada para receber estudantes que têm deficiência visual, como Gil. “A principal conclusão da nossa pesquisa é de que a política de acessibilidade da UFS é na base do improviso. Desde que Gil entrou na UFS, em 2004, as necessidades dela são atendidas de forma improvisada mesmo, sem planejamento algum. Quando aparece um problema, ‘um tapa buraco’ é a primeira solução que surge”, afirmou Miriam.
A estudante também denuncia, em sua pesquisa, o comodismo que, segundo ela, foi estimulado dentro da administração da universidade pela existência de bolsistas que acompanhavam a estudante com deficiência visual. “A UFS passou a conceder a Gil uma bolsa de R$ 180, para que ela pudesse arcar com materiais necessários, como fitas e um gravador, que a ajuda a acompanhar as aulas. Um estudante também recebe o mesmo valor para guiá-la pela universidade. Eu fui uma dessas bolsistas, e posso dizer que não havia critério algum de escolha, além de não passarmos por treinamento. A própria Gil é quem indica seu guia. E, sem capacitação, fica difícil, às vezes, atender uma ou outra necessidade que possa surgir. Já ficamos de mãos atadas, sem saber o que fazer, em determinadas ocasiões”, lamentou Miriam.
O estudante Horimo Medeiros, que efetivou a pesquisa junto com Miriam, fez uma abordagem sociológica sobre o caso particular de Gil. “Segundo Portaria do Ministério da Educação (MEC), as universidades são obrigadas a se inserirem nessa política de acessibilidade. Na prática, esse direito não é realmente efetivado, pois o debate sobre inclusão é geralmente limitado aos estudantes carentes, e raramente engloba os portadores de necessidades especiais”, afirmou Horimo.
Horimo também denuncia a situação da UFS como reflexo de um descaso geral com a situação. “Parece que o Estado vê esse tipo de assistência como favor. Apenas participa de parcerias e ‘morre’ por isso mesmo. Mas o correto é que ele se coloque como responsável pela elaboração e efetivação de políticas públicas de acessibilidade”, explicou o estudante de Ciências Sociais.
Miriam e Horimo participam do Grupo de Trabalho (GT) “Por uma universidade sem deficiências”, junto com Josimeire Batista, aluna do curso de Pedagogia. Na Semana de Acessibilidade, Josimeire problematizou as estruturas da Didática V, ainda em construção. “Alegamos à Prefeitura do Campus que não havia acessibilidade na planta estrutural da Didática V. As portas eram tão estreitas, que as cadeiras de roda não passavam. Avisamos ao prefeito que, na Semana de Acessibilidade, estaríamos passando com uma cadeira, e para nossa surpresa e alegria, eles haviam alargado a porta. Mas, no geral, a planta da empresa construtora só prevê a ampliação dos banheiros. Há um fosso quanto à acessibilidade, desrespeitando as normas da ABNT”, alega a estudante.
Outro projeto de construção que está sendo questionado pelo grupo é a revitalização do Complexo Desportivo da UFS. Este inclui a piscina, a sala de judô, o ginásio de esportes e a sala de dança do Departamento de Educação Física (DEF). “Estamos lutando para que a piscina tenha rampa para os cadeirantes e professores devidamente treinados para recebê-los”, adiantou Miriam. De acordo com Pedro Jorge, chefe do Departamento, essas já são as prioridades do projeto. “Os engenheiros da obra já estão cientes das atividades emergenciais, como a construção de passarelas, que vão do departamento administrativo até a piscina, e rampas, para ampliar o acesso. Além de banheiros apropriados, com estrutura de metal”, adiantou o professor.
O Grupo de Trabalho está elaborando um projeto para criação de um Núcleo de Apoio aos Portadores de Necessidades Especiais, na UFS. De acordo com Miriam, esse projeto já foi apresentado à universidade, na Semana de Acessibilidade. “Queremos implementar um núcleo que possa dar suporte estrutural e pedagógico a esses estudantes. Já encaminhamos o projeto ao professor Ponciano, Pró-Reitor de Graduação (Prograd). Ele disse que quer ajudar, mas precisa estudar melhor, porque ainda não tem noção de como proceder”.
Processo Seletivo Seriado
A UFS não reserva vagas do PSS para estudantes com necessidades especiais, ou seja, eles competem em condições de igualdade com todos os candidatos ao vestibular. De acordo com Miriam, isso é sintoma de uma instituição despreparada para abrigar esses alunos. “Quando Gil passou no vestibular, os professores sequer haviam sido informados de que receberiam uma estudante com necessidades especiais. Houve muitos constrangimentos, porque não havia preparo para lidar com as necessidades de Gil. Ás vezes, ela era argüida no birô enquanto o resto da turma fazia a prova escrita”, revelou Miriam.
O coordenador do processo de vestibular da UFS, professor Manoel Leite, alega que, para esses estudantes, há um tratamento diferenciado na hora do concurso. “Ao todo, recebemos 16 candidatos com necessidades especiais, e todos eles fizeram prova em uma das alas do Colégio de Aplicação (Codap), com um professor e dois fiscais para cada um. Todos os deficientes visuais tinham visão parcial, e, para eles, foi elaborado um cartão de respostas ampliado. Outro candidato que tinha problemas motores e não conseguia escrever nada, respondeu a prova em um computador reservado, com o acompanhamento de um professor”, explicou.
Quando à reserva de vagas para o vestibular, o professor foi enfático. “Sempre fui contra as cotas. Mas, diante das cotas que estão sendo criadas por aí, acho mais justo que sejam privilegiados os portadores de necessidades especiais”.
Por Priscila Viana
De acordo com o trabalho, a universidade não estaria preparada para receber estudantes que têm deficiência visual, como Gil. “A principal conclusão da nossa pesquisa é de que a política de acessibilidade da UFS é na base do improviso. Desde que Gil entrou na UFS, em 2004, as necessidades dela são atendidas de forma improvisada mesmo, sem planejamento algum. Quando aparece um problema, ‘um tapa buraco’ é a primeira solução que surge”, afirmou Miriam.
A estudante também denuncia, em sua pesquisa, o comodismo que, segundo ela, foi estimulado dentro da administração da universidade pela existência de bolsistas que acompanhavam a estudante com deficiência visual. “A UFS passou a conceder a Gil uma bolsa de R$ 180, para que ela pudesse arcar com materiais necessários, como fitas e um gravador, que a ajuda a acompanhar as aulas. Um estudante também recebe o mesmo valor para guiá-la pela universidade. Eu fui uma dessas bolsistas, e posso dizer que não havia critério algum de escolha, além de não passarmos por treinamento. A própria Gil é quem indica seu guia. E, sem capacitação, fica difícil, às vezes, atender uma ou outra necessidade que possa surgir. Já ficamos de mãos atadas, sem saber o que fazer, em determinadas ocasiões”, lamentou Miriam.
O estudante Horimo Medeiros, que efetivou a pesquisa junto com Miriam, fez uma abordagem sociológica sobre o caso particular de Gil. “Segundo Portaria do Ministério da Educação (MEC), as universidades são obrigadas a se inserirem nessa política de acessibilidade. Na prática, esse direito não é realmente efetivado, pois o debate sobre inclusão é geralmente limitado aos estudantes carentes, e raramente engloba os portadores de necessidades especiais”, afirmou Horimo.
Horimo também denuncia a situação da UFS como reflexo de um descaso geral com a situação. “Parece que o Estado vê esse tipo de assistência como favor. Apenas participa de parcerias e ‘morre’ por isso mesmo. Mas o correto é que ele se coloque como responsável pela elaboração e efetivação de políticas públicas de acessibilidade”, explicou o estudante de Ciências Sociais.
Miriam e Horimo participam do Grupo de Trabalho (GT) “Por uma universidade sem deficiências”, junto com Josimeire Batista, aluna do curso de Pedagogia. Na Semana de Acessibilidade, Josimeire problematizou as estruturas da Didática V, ainda em construção. “Alegamos à Prefeitura do Campus que não havia acessibilidade na planta estrutural da Didática V. As portas eram tão estreitas, que as cadeiras de roda não passavam. Avisamos ao prefeito que, na Semana de Acessibilidade, estaríamos passando com uma cadeira, e para nossa surpresa e alegria, eles haviam alargado a porta. Mas, no geral, a planta da empresa construtora só prevê a ampliação dos banheiros. Há um fosso quanto à acessibilidade, desrespeitando as normas da ABNT”, alega a estudante.
Outro projeto de construção que está sendo questionado pelo grupo é a revitalização do Complexo Desportivo da UFS. Este inclui a piscina, a sala de judô, o ginásio de esportes e a sala de dança do Departamento de Educação Física (DEF). “Estamos lutando para que a piscina tenha rampa para os cadeirantes e professores devidamente treinados para recebê-los”, adiantou Miriam. De acordo com Pedro Jorge, chefe do Departamento, essas já são as prioridades do projeto. “Os engenheiros da obra já estão cientes das atividades emergenciais, como a construção de passarelas, que vão do departamento administrativo até a piscina, e rampas, para ampliar o acesso. Além de banheiros apropriados, com estrutura de metal”, adiantou o professor.
O Grupo de Trabalho está elaborando um projeto para criação de um Núcleo de Apoio aos Portadores de Necessidades Especiais, na UFS. De acordo com Miriam, esse projeto já foi apresentado à universidade, na Semana de Acessibilidade. “Queremos implementar um núcleo que possa dar suporte estrutural e pedagógico a esses estudantes. Já encaminhamos o projeto ao professor Ponciano, Pró-Reitor de Graduação (Prograd). Ele disse que quer ajudar, mas precisa estudar melhor, porque ainda não tem noção de como proceder”.
Processo Seletivo Seriado
A UFS não reserva vagas do PSS para estudantes com necessidades especiais, ou seja, eles competem em condições de igualdade com todos os candidatos ao vestibular. De acordo com Miriam, isso é sintoma de uma instituição despreparada para abrigar esses alunos. “Quando Gil passou no vestibular, os professores sequer haviam sido informados de que receberiam uma estudante com necessidades especiais. Houve muitos constrangimentos, porque não havia preparo para lidar com as necessidades de Gil. Ás vezes, ela era argüida no birô enquanto o resto da turma fazia a prova escrita”, revelou Miriam.
O coordenador do processo de vestibular da UFS, professor Manoel Leite, alega que, para esses estudantes, há um tratamento diferenciado na hora do concurso. “Ao todo, recebemos 16 candidatos com necessidades especiais, e todos eles fizeram prova em uma das alas do Colégio de Aplicação (Codap), com um professor e dois fiscais para cada um. Todos os deficientes visuais tinham visão parcial, e, para eles, foi elaborado um cartão de respostas ampliado. Outro candidato que tinha problemas motores e não conseguia escrever nada, respondeu a prova em um computador reservado, com o acompanhamento de um professor”, explicou.
Quando à reserva de vagas para o vestibular, o professor foi enfático. “Sempre fui contra as cotas. Mas, diante das cotas que estão sendo criadas por aí, acho mais justo que sejam privilegiados os portadores de necessidades especiais”.
Por Priscila Viana
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